Esta é uma frase mágica.
Lembras-te da sensação de estar com alguém pela primeira vez e descobrir que têm muitas coisas em comum? No final da conversa até ficas com a impressão de que já conheces a pessoa de qualquer lado, ou perguntas-te como é que ainda não te tinhas cruzado com ela.
O ser humano desconfia do que é diferente. Se em tempos idos um homem via ao longe outro, com vestes parecidas com as suas e as mesmas pinturas na cara, queria dizer que era da sua tribo, que estava em segurança, que podia confiar. Se o indivíduo fosse diferente, os sentidos ficavam em alerta, sentiam o perigo, e preparavam-se para reagir a uma ameaça. Este padrão ainda ecoa nos dias de hoje, muitas vezes de forma inconsciente, e protege-nos do perigo, por um lado, e por outro faz com que o nosso círculo de influência esteja cheio de pessoas parecidas connosco.
Talvez por isso uma das formas de estabelecer uma relação de confiança é dizer «Eu também»: se o cliente tem receio de tomar uma decisão, falar do nosso próprio medo ao tomar certas decisões; se o cliente refere os filhos, falar dos nossos filhos; se ele diz que gosta de carros, falar da nossa paixão.
Dizer «Eu também» é procurar os elementos em comum com o outro, é construir uma ponte que liga ao outro. Dizer «eu também» vai alimentar a sensação de que gostámos da companhia um do outro, porque gostamos das mesmas coisas, porque temos as mesmas experiências, porque somos da mesma tribo.
Há muitos anos um dos meus filhos fez uma asneira grande na escola e eu decidi levá-lo a uma psicóloga. No primeiro encontro falámos os três, estava eu, a psicóloga e o miúdo, que na altura tinha onze anos. Eu expliquei o que se tinha passado, que ele tinha sido suspenso na escola, que queriam expulsá-lo, e disse que estava preocupado, sobretudo porque ele tinha mentido.
Ela ouviu com muita atenção, e perguntou «Então ele mente? É só isso? Eu também minto, o pai também mente. Mentir faz parte do ser humano». A cara do meu filho abriu-se num sorriso. «Ainda hoje de manhã, eu vinha para cá, e atrasei-me», continuou ela, «telefonei e disse que estava quase a chegar, que tinha apanhado trânsito, que tinha havido um acidente. Era tudo aldrabice».
O meu filho ficou claramente impressionado.
«O problema é quando as mentiras prejudicam alguém», disse ela, «deixe-me conversar com ele e depois falamos» e correu comigo da sala. Numa frase, ela tinha pegado no meu discurso e usado uma história para dizer ao meu filho «Eu também sou mentirosa, vamos lá falar sobre a mentira» e dessa forma criar uma relação de confiança, essencial no trabalho de um terapeuta, para depois poder conversar com ele sobre as coisas importantes.
Esta conexão chama-se aliança terapêutica e é um conceito usado em psicologia para descrever a relação que se estabelece entre o terapeuta e o cliente. Nas vendas essa conexão é igualmente importante: é preciso criar uma relação de confiança com o cliente para conseguir percebê-lo, comunicar a um nível mais profundo, poder servi-lo como ele precisa. Uma das formas de ganhar essa confiança é dizer «Eu também».
Mas quando dizes «Eu também» tens que ser verdadeiro: não serve fabricar semelhanças, inventar parecenças, mentir. Tens que usar o que é real.
O problema é que às vezes estamos tão apertados no nosso pequeno mundo de pessoas parecidas connosco que não conseguimos reconhecer nada que saia desse molde. Para conseguir encontrar os pontos em comum temos que sair do nosso casulo e olhar para a pessoa que está à nossa frente com genuíno interesse.
É sempre possível encontrar qualquer coisa que temos em comum com os outros. Basta pensarmos que somos todos seres humanos, com um pai e uma mãe, que muitas vezes partilhamos um país, uma cultura, uma época. Todos temos que acordar e dormir e comer e ter uma forma de pagar as contas, todos temos sonhos e ambições e medos e desafios. Todos procuramos reconhecimento e conexão, segurança e liberdade.
O Rui Veloso tem razão: «muito mais é o que nos une que aquilo que nos separa».
Quando consegues encontrar qualquer coisa em comum com as pessoas que são muito diferentes a tua tribo vai-se expandir e tu vais crescer, vais ser grande, vais transformar-te na pessoa a quem os outros dizem «Não nos conhecemos de qualquer lado?».